Manaus,24 de novembro de 2024

“A população precisa de algo muito melhor”, diz Carlos Almeida sobre governo de ex-aliado

Vice-governador na primeira gestão de Wilson Lima (União), o defensor público Carlos Almeida, agora filiado ao PT, voltou a ganhar destaque nos noticiários desta semana ao anunciar que levou, por meio da Defensoria Público do Amazonas, o caso de perseguição trabalhista e assédio moral que os servidores celetistas da antiga Fundação de Televisão e Rádio Cultura do Amazonas (Funtec), hoje Tv Encontro das Águas, teriam sofrido.

Em entrevista ao Comun, Carlos Almeida falou sobre esse processo, que foi levado ao Supremo Tribunal Federal (STF), fez uma análise da gestão do governo Wilson, seu ex-aliado, da atuação da Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam), falou sobre o ingresso tumultuado no PT e de seus novos rumos políticos.

Confira a entrevista:

COMUN – Como iniciou esse processo das denúncias de assédio e perseguição envolvendo a Funtec?

A situação deles remonta muitos anos atrás, porque eles entraram em 1993, pouco depois da construção de 88, e desde então isso gerou problemas. A questão toda se refere a uma problemática jurídica, porque eles entraram numa estrutura que hoje é uma Fundação Pública de Direito Público, mas que já foi Fundação Pública de Direito Privado, que já foi autarquia antes. Isso é consequência das reformas que o Estado vai fazendo gestão após gestão. Mesmo no último quadro houve mudança, o nome mudou para TV Encontro das Águas e a alteração da natureza jurídica. A questão é que naquele tempo, em 1993, existiam pouquíssimos profissionais na área de TV. Existem ainda poucos hoje, mas na época muito menos ainda e eles foram convidados para integrar nesse quadro. Depois de muito tempo dentro da administração, eles começaram a sofrer problemas. E eles procuraram o Ministério Público do Trabalho, correto, para poder buscar a defesa deles. Qual foi a surpresa deles? logo depois deles terem procurado o MPT, o MPT em vez de defender, entrou com uma ação contra eles, utilizando a TV que estava perseguindo eles, como um acordo, ou seja, em vez do MPT punir a TV, o MPT arrasou a voz deles, o que é algo terrível. Nesse processo que ocorreu na Justiça do Trabalho, o sindicato dos jornalistas e dos radialistas ainda tentou entrar no processo, mas a Justiça proibiu, o que é um absurdo.

COMUN – Que situações de assédio os servidores alegam estar sofrendo por parte dos superiores da TV?

Uma coisa é o assédio moral lá atrás, outra coisa é o hoje. Naquele tempo, quando a gente entrou com a Ação Judicial, a Justiça do Trabalho, a gente entrou com a Rescisória, a gente entendeu que não tinha ocorrido um devido processo legal e que eles deveriam ter o direito de se defender. Isso a gente resolveu ainda em 2010. Nós conseguimos eliminar na rescisória, aí o processo vem correndo desde 2010 no Judiciário até hoje. Passou pelo TRT, passou pelo TST e agora está batendo no STF. A questão é que dentro da TV Cultura, no atual momento, as informações são inúmeras a respeito da perseguição hoje do atual diretor, que em várias reuniões, inclusive diversas gravadas, tem tratado as pessoas como se elas fossem invasoras da TV. TV essa que elas ajudaram a criar, o que é errado. Há um último vídeo inclusive, em comemoração aos quatro anos de TV, na verdade desse novo nome, porque a tv tem bem mais do que isso. Isso é uma atitude esquisita. Por acaso essa pessoa (o diretor Oswaldo Lopes) disse que já recebeu ordem da justiça para demitir os trabalhadores, e isso é uma inverdade. Na verdade, eu vou colocar o nome correto, o nome disso é mentira, porque não tem porquê esses servidores serem demitidos agora, porque a justiça não determinou isso. O que está acontecendo é uma atuação do Estado, representado pelo diretor da TV Cultura, tentando perseguir as pessoas que deveriam ter sido protegidas por ele. E até o presente momento, só a Defensoria tem falado. Mesmo quando eu tive, durante a minha curta estada no Estado, nós estávamos caminhando no sentido de fazer essa composição. Mas no momento onde eu rompi com o Estado, eles ficaram abandonados e passaram a ser sucessivamente perseguidos. Alguns demitidos, outros morreram, mas pelo menos mais de 120 servidores, eu garanto, ainda lutam para estar empregados e contra o assédio moral que enfrentam.

COMUN – Qual a situação atual do processo. Essa é a última esfera?

Exatamente. A gente entrou com uma peça chamada agravo interno ou agravo regimental. Vai ser ouvido os réus, que no caso é o Estado. É muito importante que o Estado assuma seu papel de salvaguarda dos seus próprios servidores e defenda eles e entenda que eles precisam ficar. O momento ainda vai acontecer. Se o Estado disser qualquer coisa diferente do que eu estou dizendo, está ocorrendo um absurdo. Porque é um compromisso histórico do Estado e era compromisso pessoal meu, compromisso pessoal do governador defendê-los, porque isso foi ouvido em campanha, nós nos comprometemos a defender eles. Eu já fazia isso desde 2010, então não estava fazendo nada diferente. Só que o governador é jornalista, ou seja, é um compromisso dele. Uma categoria que é dele, ele tem que defendê-los.

COMUN –  O senhor fez parte do primeiro mandato do governador Wilson Lima. Que análise faz sobre a gestão dele até agora?

Efetivamente, a gente precisa de um prócere que represente o estado e respeite a população com o respeito que precisa e isso, sinceramente, não aconteceu e continua não acontecendo. Mesmo os programas que têm saído são exatamente isso, programas ou então propagandas. O que é o Amazonas Mais Seguro? Foi lançado ano passado e ninguém sabe o que ele significa, porque, na verdade, ele é apenas uma peça de propaganda. Apesar de estar aí, o Amazonas está como o estado com maior índice de violência do Brasil. Isso já respondeu a questão. Aí nós temos outra questão, que é o programa de moradia, é minha praia atuo nisso e é mais uma peça propagandística e ainda se está devendo aquilo que a população deseja: a implementação correta e adequada de políticas públicas, necessariamente sociais que permitam caminhar por um desenvolvimento legal. Então a nossa população que está na Amazônia ainda está carente da implementação de diretrizes básicas de direitos de desenvolvimento e isso não vem acontecendo. Se você perguntar o que eu desejo? desejo boa sorte. Eu acho que ele (Wilson Lima) tá tentando acertar, mas eu acho que, como já dizia o Chaves, “às vezes sem querer querendo a gente acaba fazendo besteira”. E a população precisa de algo muito melhor. Às vezes a preocupação de quem está na administração é evitar com que haja a próxima hecatombe. O ano de 2020, até agora, é pródigo em situações onde isso acontece. Olha só o que aconteceu recente. Não tem um mês que aconteceu uma operação no núcleo da segurança pública. Eu não sei se vocês estão lembrados. Eu exonerei o Bonates em 2021 dizendo exatamente o que estava acontecendo agora.

COMUN – Falando especificamente desse momento, o que aconteceu, de fato, para que ocorresse essa exoneração?

Eu tinha rompido com o governo em maio de 2020. E desde lá não pisei mais no palácio. Fiquei assumindo o meu posicionamento, o posicionamento coerente que eu venho mantendo até agora. Em 2021, um ano depois, o Comando Vermelho estava dizendo e acusando o Bonates de não estar cumprindo o acordo com eles, todo mundo estava vendo isso, e o Comando Vermelho impôs um toque de recolher: três dias a população não saiu na rua com medo do toque de recolher, e o secretário de segurança pública estava apeado, estava explícito o comprometimento, e o governador não fez nada porque era refém dele. Eu falei isso na imprensa, e isso estava claro nessa situação, estava absolutamente claro, mais do que isso, houve depois a informação absolutamente escandalosa de que estava tendo o envolvimento dele com essa situação referente a essa questão de comércio ilegal de ouro, nenhuma providência foi tomada pela administração, alguma medida precisava ser realizada. Então, eu assumi o governo. A legislação diz claramente que com um governador ausente, o vice governador entra exercício. Desde o meu rompimento em maio de 2020 até aquele momento e depois, diversas vezes, dezenas de reuniões externas foram realizadas pelo governador e eu não fui comunicado. Eu não estou, eu não estava em busca de poder, se eu tivesse eu tinha tomado outra providência. Só que naquele momento aquilo era um absurdo, então, como Governador exerci isso. Requisitei a presença do chefe da Casa Civil e exerci a medida. Os considerandos estão claros lá, se você não quiser ler os considerandos, tá lá o caso do Abacaxi, que por acaso teve agora demanda recente, apareceu no Jornal Nacional. E aí disse que não podia ficar. Governador chegou a retornar e quis desfazer o ato. Eu disse no dia seguinte, se desfizer o ato, tá assumindo que é cúmplice. O diário oficial ficou paralisado durante uma semana e o Bonates, uma semana depois, disse que saiu por motivo de foro íntimo. Mentira, mentira, ficou exposto. Só que uma coisa que todo mundo sabe é que, apesar de afastado, ele continua lá, dando ordens lá dentro. Todo mundo sabe e isso provavelmente vai ficar claro agora com as operações que acontecerem.

COMUN – O senhor mudou de partido recentemente, pretende retornar à cena política nas próximas eleições?

A minha preocupação é bem mais estrutural do que o superficial com o pessoal na atual política. Então assim, eu posso me colocar. E aí falando no momento político de agora. Eu entendo que a construção política deve ter significado, então assim, se ela me propõe um cenário político eu tenho que fazer o que tem significado, o que eu acredito. Eu resolvi exercer isso e no momento que aquilo começar a se chocar com os meus princípios eu me afasto, então eu entendo ainda que o Amazonas precisa de uma política base, de implementação social, de forma adequada e isso tem que acontecer. Se você não prega isso, acaba outro ocupando o espaço para o nada, porque, por exemplo, veja a Assembleia agora, as pessoas vão dizer que é crítica, mas isso é fato, a Assembleia largou o seu papel de ser casa do povo para poder virar uma casa de homenagens. Só isso, só isso, só isso, o que a gente tem que comentar sobre isso? Nada, ela se reduziu esse papel, ponto. E recentemente agora, aprovando projetos que são completamente desnecessários, olha só: Débora Menezes, dando uma aqui de Dom Quixote, guerreiro fantasma, “vamos fazer aqui um projeto sobre cristofobia”, mano eu sou cristão. Eu nunca tive nenhuma restrição em relação a essa religião. Ao contrário, as matrizes africanas tiveram e são debochadas. Então, quer dizer que o maior estado indígena do Brasil, agora é um estado gospel? isso está errado. Eu vou tomar providência sobre isso. Estamos trabalhando com isso agora. Você tem coisas reais aqui no Amazonas para se preocupar. E não é esse tipo de besteira. Qual é o nome disso? Qual o nome correto disso? No campo das provas se chama besteira. Porque assim, você tem deboche e gozação, outras coisas. Você pergunta pra essa pessoa mesmo a respeito do despacho que tem lá na frente do aeroporto, ela vai fazer uma zoeira. E aquilo ali é uma manifestação religiosa que merece proteção.

COMUN – O senhor se considera uma peça importante do PT nas próximas eleições? Se sente preparado para o próximo pleito?

Estar preparado não significa muito dentro do PT, tá? Até porque, por exemplo, eu vou dar uma de miserável agora, tá? Por exemplo, quando eu entro no PT, aí o PT tem um ritualzinho pra entrar, é muito interessante o ritual do PT. É louvável, inclusive. E aí qualquer um pode impugnar depois de determinado prazo. E apesar de eu ser defensor de 18 anos, apesar de eu ter duas graduações, eu sou analista de sistemas, eu sou bacharel em Direito, apesar de eu ser pós-graduado, de ser mestre e doutor em Direito, de ter sete livros publicados, de ter sido vice-governador, de ter uma posição muito clara tudinho, eu fui impugnado por um DJ. É o Juan DJ. Entendeu? Com um histórico particular, inclusive muito tenebroso, o que nós conhecemos, vamos lá. E assim, isso desmerece a representação dele por ele ser DJ? Não. Mas a representação é ridícula. Eu fiz a minha resposta também. E assim, o quer queira, quer não, o PT quer resolver isso na base do voto. É engraçado, eu falei na reunião que tive sobre a situação, que o PT estava instaurando uma política lavajatista aqui dentro. Porque naquele momento ali, eu posso deixar muito claro, se juntaram para poder tentar me impugnar: Sinésio Campos, Anne Moura e José Ricardo. Então assim, os delegados deles deram sete votos para tentar me impugnar. Bom, eu sou petista já, eu já estou dentro do partido, já tenho até número de carteirinha, literalmente, petista de carteirinha. Então assim, eu acho interessante esse tipo de, de coisinha, porque, na verdade, isso tem um nome técnico no meio político, eu já falei nome técnico várias vezes, mas se chama passar recibo. Isso só mostra que eles têm preocupação da minha atuação dentro desse campo e por conta da grande possibilidade de articulação em colocar efetivamente o PT dentro da arena a qual é correta, que é a de protagonismo e discussão a respeito de política pública, e não da forma subserviente como o PT tem se tratado nos últimos anos. Veja-se só, crítica direta, o presidente estadual do nosso partido é da base do Wilson e o Wilson representa, até o presente momento, uma identidade de conexão com o bolsonarismo. O representante estadual do nosso partido pegou e votou contra os professores e votou a favor desse projeto que viola, inclusive, o nosso campo progressista. Está absolutamente errado. Você acha que uma pessoa dessa está satisfeita com a minha entrada? Eu te digo que não, porque ele fez um vídeo dizendo isso. E detalhe, está sendo descortês, porque eu fui o primeiro a comunicá-lo sobre isso, porque eu não entrei de gaiato. Eu fui convidado para tanto, e muito me honra o convite para poder integrar essa situação. Mas eu não falo pelo que eu quero, porque eu sou uma força pra poder somar na construção de um projeto melhor, mas ainda assim eu respeito o meu grupo, eu atendo aquilo que o meu grupo entende. O PT, na verdade, ele tem subpartidos, né? Então, dentro desse meu grupo eu sou mais um, eu sou soldado nessa situação, então se o PT entende que o momento de construção vai exigir meu nome, eu vou atender o chamado. Se o PT entende que não, eu vou continuar fazendo o que eu sempre faço, porque eu continuo sendo servidor, eu só sirvo de maneira diferente. Hoje mesmo me perguntaram assim, doutor, o senhor não acha que o senhor serve melhor aqui? eu disse: eu gosto pra caramba disso só que se a gente deixa o espaço vazio pra tanto, você tem os maiores trastes do mundo falando besteira como estão falando agora. E acho que a gente precisa colocar isso no local correto, né?

Ouça a entrevista na íntegra:

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