No mundo da política, jabuti é o termo coloquial utilizado para descrever emendas ou artigos inseridos em projetos de lei que não têm relação direta com o tema principal do projeto. Essa prática, também denominada “contrabando legislativo”, ocorre frequentemente durante a tramitação de propostas no Congresso Nacional, levantando questões sobre a transparência e a qualidade do processo legislativo.
“Jabutis surgem, em grande parte, durante o processo de tramitação de projetos de lei no Congresso. Deputados e senadores aproveitam momentos de pressa ou distração para inserir emendas que beneficiam interesses específicos, sem conexão direta com o tema do projeto original. Muitas vezes, essas emendas são fruto de barganhas políticas, usadas para obter apoio a outros projetos ou para favorecer grupos de interesse específicos. Além disso, os parlamentares muitas vezes criam projetos de leis que não têm relevância prática, apenas para demonstrar que estão trabalhando. Isso pode resultar em uma inundação de informações irrelevantes para a população, dando a impressão de atividade vigorosa sem utilidade real. É como um “jabuti em árvore”: parece impressionante, mas não tem funcionalidade concreta”, explica o professor universitário e advogado, Helso do Carmo.
A falta de transparência é uma característica marcante dessa prática. A complexidade e o volume dos projetos de lei em tramitação facilitam a inclusão de jabutis sem a devida discussão pública, comprometendo a clareza e a coesão das legislações. Além disso, a inclusão de emendas desconexas pode resultar em legislações mal formuladas e contraditórias, prejudicando a qualidade das leis aprovadas.
A prática também alimenta a desconfiança da população em relação ao Congresso Nacional e ao processo legislativo, visto que a percepção de manobras obscuras se torna cada vez mais evidente. Isso gera um descrédito crescente em relação aos políticos e à democracia representativa.
O advogado ainda orienta como a população pode trabalhar para evitar os jabutis: “Quanto mais cidadania houver da parte da maioria das pessoas, e a cidadania não é apenas o ato de votar, mas de acompanhar e fiscalizar o trabalho dos parlamentares, acredito que já é uma forma de corrigir essas anomalias. Muitas vezes, o eleitor vota e depois cruza os braços. Acredito que uma das formas de minimizar esse tipo de conduta é a fiscalização contínua do trabalho legislativo e a cobrança por parte dos eleitores”, fala.
Exemplo Recente
Um exemplo recente e emblemático da prática dos jabutis ocorreu com a tramitação do Projeto de Lei 914 de 2024, que institui o Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover).
Originalmente, o projeto tratava apenas do incentivo fiscal de R$19,3 bilhões para montadoras que cumprirem critérios de descarbonização e produção de veículos sustentáveis. No entanto, o relator Átila Lira (PP-PI) incluiu um dispositivo que acaba com a isenção para pequenas importações de até US$50,00 (R$253,02), um tema completamente desvinculado do objetivo inicial do projeto.
A inclusão dessa emenda gerou divergências no plenário e foi alvo de críticas. Como justificativa, Lira afirmou que a medida se fazia necessária para defender a indústria nacional, argumentando que a isenção gerava um desequilíbrio com os produtos fabricados no Brasil, que pagam todos os impostos. Contudo, a Receita Federal defendeu a manutenção da isenção, destacando a necessidade de mais análises sobre os impactos econômicos da medida.
Como Votaram os Parlamentares
A votação na Câmara dos Deputados mostrou um cenário de divisão. Deputados da base governista argumentaram que a medida protege a indústria nacional e evita a concorrência desleal. Por outro lado, a oposição criticou a medida como um ataque à população de baixa renda. A taxação de 20% de imposto de importação sobre as compras internacionais de até US$ 50 foi votada pelos deputados de forma simbólica, sem o registro de votos individuais, nesta terça-feira (28/5).
