Em discussão no Senado Federal, a reforma tributária deve impactar todos os estados brasileiros e setores econômicos. O presidente do Sindicato dos Fazendários no Amazonas (Sifam), Emerson Queirós, classifica esta como a “mãe de todas as reformas” e define que o marco no sistema tributário deve trazer otimização na economia do Estado.
Em entrevista ao Comun, Queirós, apontou que o Amazonas está diante de uma grande oportunidade e que possibilita, pelo menos, mais cinquenta anos para desenvolver novos nichos econômicos. Segundo ele, a Zona Franca de Manaus permaneceria “resguardada” mas sob novas promessas fiscais presentes na reforma. Confira a entrevista na íntegra:
COMUN – A reforma tributária prevê a transformação de 5 tributos com a mesma incidência em apenas dois. Como será essa dinâmica?
Primeiro, temos que entender que a reforma tributária é a reforma sobre a tributação sobre o consumo. Então, a ideia é transformar esses cinco tributos em dois. São três de competências federais: o IPI, o FIS e o PIS em uma contribuição sobre o bem de serviço, transformar o ISS e o ICMS no Imposto sobre bens e serviços, e também vamos ter a figura do imposto seletivo, controlar aqueles bens que agridem, de alguma forma, tem a externatividade negativa sobre o meio ambiente e sobre a saúde. De forma geral, a ideia é fazer uma reforma tributária, não ampla, mas sobre o consumo. Para as repercussões e a dinâmica da reforma tributária no estado do Amazonas, temos que entender como é que é a nossa economia. Para quem está tentando ainda entender os reflexos na Zona Franca e Manaus, a gente tem que entender que o nosso sistema de arrecadação, nossa economia são baseados em bens duráveis de alto valor agregado, que em sua esmagadora maioria é transacionado para o mercado interno, ou seja, toda a produção do Amazonas, ela vai para o mercado interno. Isso implica dizer que, no ambiente de IVA, no ambiente de imposto de valor agregado, que tem a sua, destinação da arrecadação no destino, a gente acabaria sendo prejudicado, porque toda a nossa produção ela é demandada para o resto do país, então, nesse sentido, a gente perderia muito a arrecadação. Mais ou menos 95 % da nossa arrecadação é proveniente de transações intersetorias, estaduais, ou seja, essa tributação vai ser paga lá no destino e aí a unidade de origem vai receber o tributo, que seria a unidade. Então assim, entendendo a dinâmica da nossa economia, a gente entenderia que o imposto sobre o valor agregado, como é adotado nas grandes federações. Acho que 21 das 32 federações utilizam esse IVA de alguma forma, ou o IVA único ou o IVA dual, especificamente o Canadá e a Índia usa o IVA dual, é o modelo que o Brasil está ocupando e vai adotar. E dessa sistemática de cobrança no destino, que reduz, ela tem o grande mérito de reduzir a guerra fiscal, que é um dos grandes problemas do sistema tributário nacional, é você reduzir essa guerra fiscal. E a tributação no destino é um dos mecanismos que acaba trazendo essa guerra fiscal ao número. A um patamar bem aceitável.
COMUN – Um dos impostos que serão extintos com a reforma é o chamado IPI. Até que ponto isso pode ser nocivo para o modelo ZFM?
O IPI é o imposto que decisivo para trazer uma grande empresa, decidir se a empresa vem ou não para o Amazonas. Uma vez que a gente tem o IPI como o nosso principal imposto de tornar a empresa atrativa para produzir na nossa região, sobretudo no Polo Industrial de Manaus, uma vez o texto inicial que foi aprovado na Câmara do Deputado, parece-me que a gente garante, de alguma forma, manter a competitividade e o que era o IPI talvez vá lá para o imposto seletivo e aí a gente consegue de alguma forma compensar a produção de bens e produtos que são produzidos aqui, acaba direcionando uma alíquota de imposto seletivo para o restante do país. Isso vai fazer com que o IPI, diferencial de competitividade, acabe se mantendo na região. O que a gente tem que tentar entender são os fundos, né? Os fundos, eu acho que praticamente, um a dois bilhões, quase dois bilhões, a gente arrecada com o sistema tributário atual do FTI, da UEA e do FMPS. Porque a questão da competitividade do IPI, eu acho que ele vai mudar de nome, ele vai entrar nessa competitividade e vai ser o imposto seletivo, que é o imposto que vai estar sob o comando do governo federal. E aí a gente mantém o polo atrativo.
COMUN – Há previsão da criação do Fundo de Sustentabilidade e Diversificação Econômica do Estado do Amazonas. No campo fiscal, o recurso da União pode ser um suporte para eventual perda de receita com a reforma?
Existe uma crítica contundente em relação a esses fundos para compensar para quem já tem incentivos fiscais vigentes até 2032. Talvez a lei complementar 160 de 2017, ela convalida. Quem já teve seus incentivos convalidados, eles teriam ressarcido. É para ressarcir até 2032, a gente vai ter esses incentivos fiscais que vão ser convalidados. A crítica que se faz é o tamanho desse fundo para compensar todos os incentivos fiscais que a gente tem na atualidade. Então a crítica é essa, mas, parece -me que está destacado que para as empresas que têm incentivos fiscais amparados, ancorados, essa lei complementar 160 e 2017, ela não teria nenhum tipo de prejuízo, mas a crítica que se faz desse fundo é qual o tamanho desses incentivos convalidados, então seria uma bomba fiscal que está embutida na constituição, que a gente acaba sendo temeroso. A gente não entende a dinâmica, mas assim, independentemente da questão do ressarcimento das empresas que tem incentivo fiscal hoje, a gente precisa que essa reforma seja aprovada também no Senado porque ela tem um impacto muito positivo na economia e o Amazonas, com certeza, vai sair beneficiado após a aprovação da reforma. Então assim, a um momento assim é uma irrupção, a gente está tratando essa reforma tributária como se fosse o Plano Real de 94, que mudou a história da economia do país. Então essa reforma está sendo esperada por muitos.
COMUN – Na prática, em quanto tempo os reflexos da reforma devem atingir trabalhadores e empresários?
A gente tem visto estudos de impactos setoriais pós -reforma, né? A reforma tem um período de transição que, assim, alguns criticam esse período de transição em função, vai ver, a gente vai conviver com o atual sistema, que é caótico, disfuncional, e a gente embute o sistema simplificado. Como é que funciona esses dois sistemas lado a lado? Muitos criticam que a transição, ela foi muito longa, principalmente para os estados e municípios, quase 50 anos, mas, assim, talvez seja para calibrar, talvez não, muito provavelmente essa transição longa do imposto sobre o bem e serviço, para a gente tentar, tentativa e erro, acertos, para a gente corrigir qual a alíquota de referência, como é que a gente calibra isso, então acho que ia ir para também, foi um apoio dos estados e municípios para apoiar a reforma, de que houvesse uma transição. Uma transição lenta, suave. Outros criticam que deveria ser uma transição mais rápida, como está acontecendo com o imposto seletivo e com o IBS, com a contribuição CBS, que é o da União. Os importantes vão ter uma transição mais rápida. Então, nesse sentido, os efeitos dos dois tributos, de competência federal e dos Estados do município, eles vão ter efeitos diferenciados. Mas para o conjunto da economia e para os agentes econômicos, eu acho que ele vai ter um efeito já dinâmico na bolsa de valores dos ativos financeiros, talvez. As expectativas dos agentes ainda melhorem. Isso tudo pode se refletir na taxa de juros e outras variáveis, mas o efeito prático da reforma vai demorar um pouco para a gente sentir na economia porque, no final do estudo, talvez 2033 seja o início dos tributos, ser extinto e começar.
COMUN – Do ponto de vista tributário, como o senhor avalia o desempenho da bancada amazonense em articulações pela reforma tributária?
No grupo de trabalho, seriam dois ou três deputados de oito, tínhamos três, ou seja, o modelo Zona Franca de Manaus deveria, e como foi, blindado no relatório final do grupo de trabalho. A gente viu também o texto, foi um texto também acordado com o governo nas vésperas da votação de aprovação, 7 de julho, uma data histórica, né, que foi aprovado o texto. Acho que na semana que antecedeu a aprovação, toda a bancada estava reunida, o governo, o secretário, o grupo de trabalho da Secretaria de Fazenda, estava a todo lado com a DAS, com a equipe do Ministério da Fazenda, para tentar, de alguma forma, inserir o texto que protegesse os interesses do modelo Zona Franca de Manaus e da economia do Amazonas. Então assim, o político no final das contas é que decide o rumo da reforma tributária. A gente se debruçou em estudos técnicos, econômicos, econométricos, de finanças públicas, de reputação, para apresentar um modelo que é viável sobre o ponto de vista econômico, mas a questão política, na verdade, o grupo de pressões, houve a pressão para inserir o modelo Zona Franca de Manaus, para proteger o modelo, houve um grupo também para proteger o símbolo estacional, o outro para proteger o agro, o outro para proteger o setor de serviço, então a gente entende que está todo mundo tentando proteger o seu interesse. De certa forma, fazendo uma crítica também ao que acontece, quanto mais grupo de interesse se beneficiam na reforma, pior é o impacto para a economia. O modelo IVA era um modelo para ser não existir incentivos fiscais. Uma vez que você coloca a Zona Franca de Manaus, que tem uma importância singular, uma vez que você coloca o simples nacional, você vai ter que compensar com a líquida maior. Então, você tem aquele trade -off, quanto mais pessoas incentivadas, mais grupos de interesse são beneficiados com a exceção, com a redução da base de cálculo, com a tributação menor, mais um conjunto, mais você vai ter uma líquida de referência maior para manter a carga tributária aos níveis que se encontra hoje, que é algo em torno de 33,9 % do PIB. Então, a gente viu que o grupo, um IVA moderno, ele tem tributação no destino e redução sistemática dos incentivos fiscais. Isso é uma regra maior, mas lógico que tem alguns setores que têm que ser beneficiados aqui no Brasil, a gente entende, acho que todo cidadão de um centro entende que a Zona Franca de Manaus é importante para o planeta, para o Brasil e para o nosso modelo. Então, a Zona Franca de Manaus foi contemplada, lógico que se tem um custo pro país, se não houvesse Zona Franca de Manaus, a alíquota de referência, não seria menor? Seria sim. Mas a importância da Zona Franca, faz com que a gente tenha lá, dentro do texto constitucional, essa prerrogativa de manter os incentivos. O Simples Nacional também é importante. Então, uma vez que o Simples Nacional deteve essa prerrogativa constitucional de um setor incentivado, a gente acaba tendo que aumentar a alíquota para poder manter a carga tributária. Se não teremos que ter uma alíquota, seria uma alíquota bem menor, se todos os agentes não tivessem incentivo fiscal. A gente entra com a cesta básica. Aí eu não sei quantos itens da cesta básica a gente vai inserir na alíquota zero. Quanto mais itens da cesta básica a gente colocar, maior vai ser a alíquota de referência para manter a carga tributária. Então, a gente tem que acabar dançando. Mas no final das contas, mesmo com esse número de atores beneficiados, ainda a gente vai estar num sistema tributário muito melhor.
COMUN – O Amazonas precisa dessa reforma tributária?
Eu acho que o Amazonas hoje é 1.2, 1.5 % do PIB, significa que 98,% do PIB está fora do Amazonas. Do ponto de vista da economia nacional é muito pequeno vis a vis, mas para a economia do país, para a industrialização, essa reforma eu chamo ela de a mãe de todas as reformas. A gente precisa dela porque ela vai dar outra guinada no desenvolvimento econômico. O Amazonas pode sim ser beneficiado. Eu tô muito otimista com o resultado que nós podermos ter de um modelo de desenvolvimento muito mais pujante com a reforma tributária do que temos com esse sistema atual caótico. A gente consegue. Hoje, não é só a Amazônia que tem incentivos fiscais. Eu acho que a Amazônia, sei lá, os gastos tributários, acho que nós estamos, sei lá, 20%. Se a gente diz que no país vai acabar os incentivos fiscais, a gente mantém, então seria uma vantagem em relação às demais regiões. A gente mantém uma vantagem tributária que ela é artificial, ela não é uma vantagem tributária que só a gente que tem. A Amazônia, por todos os estados em função da sistemática de 2CMS, faz uma guerra fiscal porque ela concede incentivos e acaba abrindo mão de receita para atrair empreendedores e a gente acaba tendo muitos concorrentes, no que se diz respeito aos incentivos fiscais. Então, eu acho que a gente está diante de uma grande oportunidade para o país e a Amazônia vai, com certeza, se beneficiar após essa reforma tributária. Lógico que o nosso incentivo é até 2073, então a gente tem mais de 50 anos para tentar mudar a dinâmica. A gente está dentro do processo histórico, as coisas estão acontecendo todos os dias, a gente está aqui ligado no YouTube, na TV Senado, na Câmara, nos grupos de discussões, porque cada dia pode mudar. Então a gente espera que o texto que vai ser aprovado pelo Senado, ela não fuja muito do que saiu da Câmara, porque de certa forma foi o que deu pra fazer, não é a melhor da reforma, mas ela é muito. A gente tem uma sinalização muito positiva pros agentes que as coisas podem, a economia da Amazônia pode se beneficiar muito com essa reforma tributária. É isso que a gente espera, a gente está otimista que o país ganhe e o Amazônia ganhe muito mais. Essa é a ideia inicial.
Ouça a entrevista: