Raquel Caetano*
Meu pai, índio da tribo fulniô de Águas Belas, Pernambuco, adorava plantas. Como indígena reconhecia no chão o fundamento básico para a produção da agricultura de subsistência. No quintal de casa cultivava uma pequena horta, além de árvores frutíferas. Ainda muito pequena e sem entender as necessidades das coisas, observava curiosa o preparo que fazia com as cascas de legumes, esterco e alguns outros adubos naturais. Via-o mexer no terreno e ouvia-o dizer: “de onde se tira e não se repõe, acaba sem nada”.
Cumprindo o curso natural da vida, fui crescendo e observando não mais apenas o quintal de casa. A região do Nordeste, de onde também sou filha, tem sua história permeada pela produção agrícola. Tenho a memória impregnada pelo cheiro dos canaviais, confesso que nunca achei dos mais agradáveis; dos campos férteis do milharal, do plantio de arroz, da uva de Petrolina. Não há como visitar o passado ou presente nordestino sem perceber a importância que a agricultura teve e tem para a economia local. Da infância à fase da consciência, compreendi que, sejam cultivos em pequena ou larga escala, é preciso repor os nutrientes absorvidos por estas plantações.
A prática, por anos seguidos, da monocultura empobrece gradativamente o solo. Isto porque o cultivo de uma única variedade no mesmo terreno retira os mesmos nutrientes necessários ao crescimento daquela espécie, provocando um desequilíbrio nas reservas minerais, tornando aquela área improdutiva. Daí a necessidade, entre outras técnicas, da rotação de culturas. A alternância das espécies a cada ano permite uma variação de absorção de nutrientes, sendo possível, assim, repor a matéria orgânica, balanceando as condições bioquímicas e físicas da terra, impedindo o desgaste e permitindo que ela continue dando o seu melhor.
A alternância deveria ser a nossa palavra de ordem para a economia local. Não há como continuar com a prática da “monocultura econômica” sem exaurir a sua fonte. Depender economicamente de uma única alternativa é estarmos cientes de que estamos desgastando o nosso solo. Em tempos de recessão econômica, a cidade sentiu na Carteira de Trabalho o impacto da crise. E para onde vão aqueles trabalhadores? Onde está a rotação de cultura do nosso prado? É certo que adubamos por mais cinquenta anos a terra, o que não é certo, o que não está seguro, é que o atual modelo, que internamente já enfrenta os seus próprios desafios de sobrevivência, por mais cinquenta anos continue dando o seu melhor.
Ademais, o mundo vem passando por transformações econômicas em que a indústria não mais ocupa o mercado promissor e em crescimento. Os avanços tecnológicos têm intensificado e aberto as portas para o setor terciário em todas as localidades e economias do mundo. Percebe-se que a contenção econômica foi amortecida nos Estados que fertilizaram o comércio e serviços. O que estamos esperando nós para lançarmos novas sementes? A nossa cidade urge por ações que vão além de melhorar o campo já semeado; que neste tempo de arrumar a terra, estejamos arando para novos plantios.
*Jornalista
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